Segundo a declaração universal dos direitos humanos, em seu artigo primeiro: "todos os homens nascem livres e iguais em direito (...)". Mas o que dizer hoje sobre as classificações raciais supostas ordenar os seres humanos em superiores e inferiores, mais ou menos bem dotados para terem acesso ao "paraiso da modernidade"?O livro de Valéria Ribeiro Corossacz ultrapassa o terreno especulativo, ao estudar a mestiçagem como emblema da nacionalidade, para examinar como o "batismo social" dos certificados médicos e das certidões de nascimento constituem verdadeiros mecanismos de ordenação dos individuos e por conseguinte permitem melhor entender a relevância das classificações racialistas para a continuidade da ordem política.Ao nascer, cada bebê recebe um nome que o singulariza, identidade que só se torna duradoura e invariavel se declarado em cartório de registro civil, o que supõe que o pai ou a mãe levem a "declaração de nascidos vivos" no momento da declaração. A etnografia minuciosa das condições sociais e culturais do nascimento - enquanto fato biológico- e da incorporação de cada novo ser individualizado à naçao brasileira ("batismo social" ou ritos de passagem) permite a autora questionar o valor atual das categorias racialistas e como seu uso contribui para a reafirmação de hierarquias passadas (e ultrapassadas), inclusive nas relações de gênero. A pesquisa em maternidades do Rio de Janeiro permite prolongar a analise das formas sociais em que natalidade se processa, para refletir também sobre os modos de controle da natalidade, particularmente das altas taxas de esterilizaçao feminina. O estudo detalhado do processo de decisão sobre as escolhas em matéria de reprodução humana revela a disjunção entre exercício da sexualidade e maternidade, acentuando as diferenças na construção de futuros individuais ou intergeracionais, a dissimetria na responsabilidade de mulheres e de homens ao assegurar a procriação da espécie, recompondo as questões de ordem médica, jurídica e simbólica em jogo nos destinos sociais das crianças postas no mundo. Este estudo de caso de maternidades torna-se assim um potente instrumento para melhor entender a relação entre classificações pretensamente científicas e classificações ordenadoras de posições sociais. O nascimento de todo indivíduo, a irrupção de nova vida em uma configuração social, faz funcionar procedimentos médicos e jurídicos que permitem compreender como a nação moderna, enquanto coletividade instituida, se recria a cada instante nos corpos dos indivíduos que asseguram sua longevidade. Resumidamente: como a ordem política se inscreve nos corpos.

RIBEIRO COROSSACZ, V. (2009). O corpo da nação. Classificação racial e gestão social da reprodução em hospitais da rede pública do Rio de Janeiro. BRA : Editora UFRJ.

O corpo da nação. Classificação racial e gestão social da reprodução em hospitais da rede pública do Rio de Janeiro

RIBEIRO COROSSACZ, VALERIA
2009-01-01

Abstract

Segundo a declaração universal dos direitos humanos, em seu artigo primeiro: "todos os homens nascem livres e iguais em direito (...)". Mas o que dizer hoje sobre as classificações raciais supostas ordenar os seres humanos em superiores e inferiores, mais ou menos bem dotados para terem acesso ao "paraiso da modernidade"?O livro de Valéria Ribeiro Corossacz ultrapassa o terreno especulativo, ao estudar a mestiçagem como emblema da nacionalidade, para examinar como o "batismo social" dos certificados médicos e das certidões de nascimento constituem verdadeiros mecanismos de ordenação dos individuos e por conseguinte permitem melhor entender a relevância das classificações racialistas para a continuidade da ordem política.Ao nascer, cada bebê recebe um nome que o singulariza, identidade que só se torna duradoura e invariavel se declarado em cartório de registro civil, o que supõe que o pai ou a mãe levem a "declaração de nascidos vivos" no momento da declaração. A etnografia minuciosa das condições sociais e culturais do nascimento - enquanto fato biológico- e da incorporação de cada novo ser individualizado à naçao brasileira ("batismo social" ou ritos de passagem) permite a autora questionar o valor atual das categorias racialistas e como seu uso contribui para a reafirmação de hierarquias passadas (e ultrapassadas), inclusive nas relações de gênero. A pesquisa em maternidades do Rio de Janeiro permite prolongar a analise das formas sociais em que natalidade se processa, para refletir também sobre os modos de controle da natalidade, particularmente das altas taxas de esterilizaçao feminina. O estudo detalhado do processo de decisão sobre as escolhas em matéria de reprodução humana revela a disjunção entre exercício da sexualidade e maternidade, acentuando as diferenças na construção de futuros individuais ou intergeracionais, a dissimetria na responsabilidade de mulheres e de homens ao assegurar a procriação da espécie, recompondo as questões de ordem médica, jurídica e simbólica em jogo nos destinos sociais das crianças postas no mundo. Este estudo de caso de maternidades torna-se assim um potente instrumento para melhor entender a relação entre classificações pretensamente científicas e classificações ordenadoras de posições sociais. O nascimento de todo indivíduo, a irrupção de nova vida em uma configuração social, faz funcionar procedimentos médicos e jurídicos que permitem compreender como a nação moderna, enquanto coletividade instituida, se recria a cada instante nos corpos dos indivíduos que asseguram sua longevidade. Resumidamente: como a ordem política se inscreve nos corpos.
2009
9788571083370
RIBEIRO COROSSACZ, V. (2009). O corpo da nação. Classificação racial e gestão social da reprodução em hospitais da rede pública do Rio de Janeiro. BRA : Editora UFRJ.
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Utilizza questo identificativo per citare o creare un link a questo documento: https://hdl.handle.net/11590/417876
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